segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Os 8 Escolhidos - Capítulo 5

Capítulo 5 – O inesperado e O impossível


- Não diga besteiras! - Gal respondeu de impulso, enquanto começava a chorar. - E pare de se culpar por algo que não foi você quem fez! Eu nunca o culpei! E nunca teria esse direito! Você só queria salvar minha irmã!
- Gal... - E por um instante, ambos se esqueceram da figura grotesca que estava se aproximando lentamente deles. - ...Obrigado.
- Idiota.
- Pois é, nunca pensei direito, né? - E sorriu para o filho.
O último que ele veria, em meio a sangue e na hora da morte.
- Agora, você precisa ir.
- ...
- Apenas vá. Senão, meu sacrifício aqui foi em vão. E tente descobrir o que é isso. Depois, se afaste de tudo isso, meu filho. Viva uma vida normal e feliz, por mim. - E com isto, ele lançou seu olhar encorajador para o filho. Um que Gal não via por muitos anos, e que, da última vez, levou Mancy a decisão mais fatal de sua vida. Aquele olhar movia montanhas com sua força.
Movido por esta força de vontade, o garoto levantou-se, deixando o pai com um sorriso na face. O grande monstro agora estava praticamente em cima dele, mas a janela ainda estava ao seu lado. Lançou-se por ela segurando com as duas mãos a pequena bolsa de couro, mas foi tarde demais: O monstro agiu mais rápido que o esperado e seu longo braço se moveu para agarrar a perna de Gal, o parando antes que seu corpo ficasse completamente fora do quarto. Ele pôde ver Gary e Ann saindo do colchão com olhares assustados na direção dele, para logo em seguida ser jogado para dentro bruscamente.

- Argh! - E seu corpo se chocou contra a parede do quarto com força.
Por um leve momento o garoto pensou que ia perder a consciência, mas revelou-se mais forte que o esperado. Rapidamente levantou-se para analisar a situação: Agora a criatura estava no caminho entre ele e a janela, e não havia muita coisa a se usar como arma contra ela. De modo que, tudo que Gal fez, foi guardar a bolsa no bolso e se preparar para esquivar-se do monstro. Apostava que ele seria lento para reagir caso esquivasse, era sua única saída.
Não teve de esperar muito, a investida veio pela direita com toda força e velocidade possíveis. Gal se jogou para o chão e rolou por debaixo do braço do monstro quando este passava por cima dele. Mal teve tempo de se levantar antes que o monstro recuasse um passo e já avançasse para cima dele com o outro punho, agora frontalmente. Não haveria tempo para rolar novamente, mas o corpo de Gal agiu antes que ele mesmo pensasse. O jovem correu na direção do punho e usou os braços para se apoiar na mão do monstro, usando-a como apoio para saltar por cima do soco, antes que o atingisse. Se jogou na direção da cama e caiu sobre ela, já levantando-se no mesmo instante. Talvez tivesse alguma chance de escapar. A criatura virou-se para ele e soltou um urro disforme, como se sua presa estivesse escapando demais de seus golpes. E assim ela partiu para cima dele desferindo uma sequencia interminável de socos com os braços enormes, Gal agiu novamente com uma precisão incrível, se lançando ao chão novamente para passar por debaixo das pernas dele. Porém, neste instante, a criatura afastou-se um passo virando em direção a ele, e como resultado, acabou chutando Gal sem querer. O chute o lançou contra a parede novamente, fazendo ele perder todo o ar e sentir toda a dor que tentava ignorar com a adrenalina. E agora, o monstro vinha para cima dele com tudo, o braço direito já arqueado acima da cabeça, pronto para esmagá-lo ali.

Gal recolheu-se, não havia tempo para esquivar-se e seu corpo não respondia aos seus comandos por causa da dor. Seria seu fim, ele apenas fechou os olhos e pôs os braços a frente do corpo. E assim, passaram-se os próximos segundos. Um silêncio repentino tomou conta do quarto por alguns segundos e Gal abriu os olhos para ver porque ainda não havia morrido.
A frente dele, estava um homem de cabelos negros compridos e esfarrapados, vestia uma calça bege cheia de bolsos e uma camiseta preta justa. Na cintura, haviam duas espadas presas em suas devidas bainhas, e em suas mãos havia mais uma espada. Esta, estava trespassada no punho da criatura. Até ela demorou para entender o que estava acontecendo.

- Saia daqui agora, garoto! - Esbravejou o homem.
Mas Gal estava perdido demais para fazer qualquer coisa. O monstro urrou e repeliu o homem com o outro braço enquanto recolhia o ferido para perto do corpo. Ele apenas sacou outra espada enquanto saltou para trás para esquivar-se do braço. E antes que ele pudesse dizer mais alguma coisa, a criatura investiu contra ele.
Gal seriamente pensou que agora ele também estaria perdido, visto a veracidade com a qual a criatura havia avançado. Mas estava enganado. O homem saltou por cima do punho quando este passou horizontalmente contra ele, e logo depois abaixou-se e rolou quando o braço ferido investiu contra ele, ainda com a espada fincada nela. Mal terminado o golpe da criatura, o homem rolou mais uma vez, agora chegando assustadoramente perto da criatura, como se ela não lhe botasse medo algum, e fincou a segunda espada na cintura dela, fazendo questão de colocar toda a lâmina para dentro do corpo monstruoso.
Daquela vez a criatura tombou para trás, fazendo toda a casa tremer e fazendo também algumas boas rachaduras surgirem no chão do quarto. O desconhecido se afastou e olhou para mim mais uma vez.

- Já não disse!? Saia daqui!
Mal podia ele imaginar que Gal agora estava mais confuso que antes e por isto continuou parado observando a cena. Ele reclamou consigo mesmo enquanto sacava a terceira espada da cintura, sabia que ainda teria de lutar. Mas agora, o monstro estava completamente desestruturado, levantou-se com muita dificuldade e deu passos cambaleantes na direção de Gal.
E antes que puder fazer mais qualquer coisa, o homem saltou contra ela e fincou a terceira e última lâmina no meio do peito. A criatura urrou, e logo depois, se desfez no meio de uma grande massa negra que começou a se dissipar como fumaça no ar. Como podia ser tão fácil para ele? Era o que Gal pensava.

Enquanto isto o desconhecido foi até ele e o fez levantar-se a força, o puxando pelos braços.
- Escute, mais deles virão. Então, precisamos ir.
- Quem é você?
- Não há tempo para explicações agora. Apenas vamos.
- Gary e Ann?
- Eles vão ficar bem, os Negros vem atrás de você. E de mais ninguém.
- Negros?
- É. Vamos.
E cortou o assunto, puxando o garoto por um braço pela porta. Gal teve a infelicidade de ver tod o caminho traçado pelo monstro pela casa enquanto seguia imponente o desconhecido de cabelos compridos. Viu o Senhor e a Senhora Walles mortos pelo caminho, mas tentou ignorar a cena enquanto descia as escadas. O homem abriu a porta de entrada e saiu para o meio da rua.
Ali fora, tudo parecia normal ainda. Uma leve brisa de madrugada passou por Gal quando ele observava se mais alguma coisa anormal acontecia. Várias casas em volta já estavam com luzes acesas, e provavelmente não demorariam mais cinco minutos até abrirem as portas para olharem o que acontecia na casa dos Walles. Gal também não duvidava que já tinham chamado a polícia.

Gal foi arrastado até o meio da rua, quando o homem o soltou, e pegou algo no bolso, colocando no ouvido.
- Onde está me levando?
- Por enquanto é melhor não saber de nada, garoto. - Foi a cortada que levou.
- O que eram aquelas coisas, pelo menos diga isso!
- Não.
- Elas mataram meu pai! Diga algo!
- ... - E pareceu pensar por um instante. - Elas são...
Mas neste exato instante, um ronco de motor altíssimo surgiu, interrompendo a fala do homem. Na esquina, virou um grande veículo de três rodas em alta velocidade. Ele parecia com um tanque de guerra cinza-escuro com um motor de avião embutido. Tinha três enormes rodas, quase do tamanho das rodas de tratores, uma na frente e duas nas extremidades traseiras, fazendo ele ter uma forma triangular. Ele freou com tudo a frente da casa e então a parte da frente do veículo. se abriu e uma voz e coou lá de dentro.
- O que estão esperando!? Vamos, logo a polícia vai aparecer!
E antes que algo mais pudesse ser dito, o homem empurrou Gal para dentro do triciclo-de-guerra, e entrou em seguida. Ali dentro haviam quatro lugares, Gal se acomodou no mais ao fundo, enquanto o homem sentava ao seu lado. Na cadeira mais a frente, onde haviam diversos controles e painéis, estava sentado um homem de short marrom, camisa florida e chinelos de dedo. Ele parecia ter entre cinquenta e sessenta anos e tinha no máximo um metro e meio de altura. Também teve tempo para analisar, o homem que o salvou. Ele tinha um ar sério e grandes cicatrizes na face e em partes do corpo, como nos braços, não tinha mais de trinta e cinco anos, e parecia bem familiar para ele. Então a porta se fechou e o veículo acelerou pela rua numa velocidade impressionante, que fez o corpo de Gal ser lançado contra o banco.

Pelas poucas janelas do veículo era possível ver que se moviam rapidamente, e que haviam saído da rua. Bluesky era uma cidade pequena e cercada de campos abertos. Por isso, não foi difícil para eles saírem do perímetro da cidade, ainda mais num veículo super potente como aquele, que fazia tudo virar borrões pela janela. O velho que pilotava-o parecia ter uma prática incrível com ele, pois apertava botões e acionava alavancas com uma precisão e rapidez fora do comum. Simplesmente parecia uma só com a máquina.
E foi quando o admirava que ele virou os olhos na direção dele, encarando-o.

- Este é o escolhido?
- Sim, tenho certeza absoluta. - O homem respondeu.
- Ora! Porque diabos um garoto!? Olhe só para ele, não pode fazer nada!
- Tudo tem seu tempo, Hórus. Vamos ver o que ele é capaz de fazer outra hora. Por enquanto precisamos apenas nos afastarmos para conseguir alguma segurança. É melhor um escolhido imprestável vivo do que um útil e morto.
- É, tem razão. Tem razão. - Disse Hórus, e apertou mais uma sequencia de botões do painél.
O veículo responde com alguns sons baixos que soaram perto dos controles e em seguida acelerou. Gal achou que seria uma boa hora para perguntar algo.

- Será que agora poderiam me dizer alguma coisa?
- ... - O homem o observou. - O que acha, Hórus?
- É uma boa falar algo para ele. Vai que ele fica doido?
- Tudo bem. Diga o que quer saber. - E virou-se para Gal.

- Primeiramente, quem são vocês?
- Enviados para te salvar. Prefiro não entrar em detalhes sobre isso agora. Quando lhe explicar toda a história, entenderá tudo. Prossiga.
- Tudo bem... O que é aquele... Monstro?
- Nós os chamamos de Negros. São grandes criaturas formadas de uma personificação de caos e destruição. Em breve, vão começar a surgir muitos deles pelo mundo, e não conseguiremos mais escondê-los.
- Existem mais?
- Sim. Infinitos. E está encerrado, prefiro não lhe dizer mais nada por enquanto.
- Só mais uma pergunta, então.
- ...
- Posso?
- Diga logo.
- Quem é você?
- Eu sou Khalador.

Não fiz revisão. Podem haver erros de português. Me avisem caso acharem algum deles.

Leia até o fim...

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Os 8 Escolhidos - Capítulo 4

Capítulo 4 – Memórias de um passado sofrido

- Cheguei! - Gritou Gal ao chegar em casa. A nova escola era realmente incrível, ainda mais quando se estava entrando para o mundo da adolescência. Deixou a mochila ao lado da porta de qualquer jeito e descalçou o tênis antes de ir para a cozinha. O cheiro do almoço já estava dando embrulhos volumosos em seu estômago.
- Ora! Quanta animação. - Veio a voz feminina da cozinha. - Parece que tudo ocorreu bem por lá, não é, querido?

A mulher tinha não mais que trinta e cinco anos e esbanjava felicidade em cada gesto. Os cabelos negros e volumosos, sua marca mais famosa, estavam presos num coque para que a gordura não espirrasse neles. Gal surgiu na porta e sentou-se no seu lugar na mesa.

- É! Tudo é demais por lá! Sabia que eles tem até pistas de skate, mãe?
- Verdade? Ora, isso é ótimo. - Disse ela, enquanto colocava um ovo frito direto da panela para um prato na mesa. - Mas não muda o fato que não vou deixar você andar de skate, menininho.
- Mas mãe! É no colégio!
- Sim. Mas você continuaria em cima de algo que considero perigoso. Então, nem pensar!
- Eles tem supervisores de pátio!
- Depois que você cair, de nada vai adiantar. - E mesmo discutindo, ela não perdia o bom humor de sempre.
- Mas...
- Sem mas, Gal. Você não vai contrariar o pedido de uma mulher grávida, não é? - Disse, fazendo um leve bico. Com aquilo Gal desviou o olhar e travou para não segurar o riso.
- Apelar para isso é golpe baixo. - E logo depois escapou uma risada gostosa de se ouvir. Neste mesmo instante, o carro estacionou na garagem. Jeorge estava na porta da cozinha, colocando as chaves sobre o balcão. Ele sorriu ao ver o garoto e a mãe ali. Caminhou até a esposa e a beijou rapidamente, para depois ir até o menino, e enchê-lo com um belo cafuné.

- E como foi lá, Gal? Gostou?
- Claro, Amei! Mas a mamãe não está deixando eu andar de skate!
- Como é? - E fez uma cara de assustado pela metade.
- Pois é. Mas não tem perigo algum! Afinal, é dentro do colégio e tudo mais...
- Hm... Verdade. Verdade. - E Jeorge virou-se para a mãe. - Que tal, Mancy? Porque não dá uma chance para seu querido filho? Ele anda se comportando bem, afinal.
- Sim! Nunca mais atrasei em limpar meu quarto ou em cortar a grama! Por favor, mãe! - E fez uma cara de coitado para ela. Mancy se virou para encarar os dois homens da casa fazendo a mesma cara para ela. A início, enfrentou-os com uma expressão inflexível. Mas não resistiu dois segundos para apoiar a testa na mão e soltar um suspiro, seguido de um sorriso. - Tudo bem. Mas apenas se usar joelheiras e cotoveleiras!
- Claro, Mãe! Claro! - Disse Gal imediatamente.
- E também, só quando fiscais de pátio estiverem olhando!
- Sim senhorita! Obedecerei!
- E você, Senhor Jeorge, devia parar de ir contra sua esposa! - E finalmente voltou para o fogão. Jeorge levantou-se e foi até ela. A abraçou e apoiou de leve o queixo sobre o ombro dela para beijá-la em seguida.
- Não fui contra você, querida. Só fui a favor de meu filho!
- E não deu quase na mesma? Ora! - E riram.

Assim foi o almoço, como sempre. Risadas a parte, conversas sobre responsabilidade no novo ano e as histórias de como o trabalho de Jeorge eram divertidas. O tempo passou num instante, e logo, Gal já estava no seu quarto, fazendo as primeiras lições de casa, enquanto os pais se preparavam para sair. Ele ouviu leves batidas na porta para logo depois ver seu pai abri-la.
- Estamos indo ao médico. Voltamos mais tarde, sim?
- Tudo bem. E pai...
- Sim?
- Eu ainda aposto que é uma menina.
- Que nada, você terá um novo irmão. Com certeza! E esse escolherá um time bom para se torcer!
- Duvido! - E Jeorge fechou a porta com uma risada. Dali em diante, a tarde foi bem tediosa para Gal. Ele terminou as lições dele em pouco tempo, elas nunca foram problemas para ele. Notas e escola, alias, nunca foram um problema. Ele simplesmente conseguia tirar notas boas sem muito esforço. De qualquer modo, Gal revisou os exercícios e depois tirou um bom cochilo. O resto da tarde foi alternado entre jogar videogame e assistir televisão.

Já eram quase sete da noite quando Gal ouviu o barulho do carro entrando na garagem. Eles haviam demorado muito mais que o esperado. Apenas abriu um sorriso e se recostou na parede enquanto estava sentado na cama. O pai logo viria para lhe dar a notícia. As mais novas notícias, afinal de contas, não fazia muito tempo desde que Mancy tinha engravidado novamente, e desde então a barriga dela começou a crescer timidamente. Para Gal, filho único, aquilo havia sido uma enorme alegria. Tão grande que ele nem chegou a pensar em coisas como dividir bens e nos ciúmes pela atenção dos pais. Simplesmente estava feliz.
Logo, os passos soaram pelo corredor e o coração do jovem Gal palpitou mais rápido. O som deles aumentou conforme os pais se aproximavam. Até que, subitamente, os barulho começou a diminuir. Os pais haviam passado direto pelo quarto dele. Algo estava errado. Jeorge não seria assim tão frio, no mínimo estaria conversando e falando alto por aí, comemorando a vinda do segundo filho, ou filha.

Gal esperou alguns poucos minutos para ver se algo acontecia, e logo depois abriu a porta de seu quarto o mais silenciosamente possível. Se esgueirou pelo corredor, arrastando os joelhos no chão para evitar qualquer ruído. A porta do quarto dos pais estava entreaberta, de modo que apenas um pequeno filete de luz iluminava o corredor. Gal sentou-se ao lado da porta e pôs um olho sobre a abertura.

- Não! Não dá para entender, Jeorge! - Rompeu a voz de Mancy, bem abatida.
- Eu sei querida, mas temos que aceitar os fatos e seguir.
- Seguir como? Como diabos vou poder ir em frente depois de saber disso tudo? Eu não sei nem que decisão tomar ainda... - Jeorge a consolou, sentando-se ao lado dela na cama enquanto a envolvia nos braços. Mancy aceitou de bom grado.
- Tudo bem. Fique tranquila, eu estou aqui com você, amor. E nós também temos o Gal, não é?
- Sim. - Disse, quase sem notar. - Deus, o Gal! Como vamos contar isso para ele?
- Não sei. Mas precisamos ter calma. Mas eu acredito que ele vai aceitar tudo e nos dar a força dele. Afinal, você conhece seu filho. - E Jeorge tentou abrir um sorriso.
- É. Obrigada, querido. Acho... Acho que já estou melhor. Mas... Que decisão devo tomar, agora? - E ela o olhou, profundamente. - Mesmo estando numa gravidez de risco... Vale a pena continuar?
- ... - Jeorge calou-se, pensando.
- Posso por em risco a minha vida e a do bebê... Mas gostaria de tentar, Jeorge. Eu sei. Eu sei. Isso é muito egoísmo, também temos o Gal. Só que... - E as lágrimas começaram a brotar dos olhos da mãe de Gal. Ela provavelmente estava daquela forma no carro, antes de chegarem ali. - Eu não sei o que fazer, Jeorge.
- Mancy... - Por um instante, ele também pareceu não saber o que iria dizer. E, num piscar de olhos, uma determinação sem igual surgiu na face de Jeorge. Ele abriu um sorriso e segurou a esposa pelos braços, bem próxima de seu corpo. - Mancy. Vamos tentar. Você é forte, E nossa filha também é. Mesmo correndo tantos riscos. Eu.. Eu sei. Eu sinto que vamos conseguir transpor todas essas barreiras. Não aborte, querida. Por favor. Sempre ficarei ao seu lado. Vamos conseguir, eu sei.
E com aquela fala. Mancy agora parecia ter ido a outro mundo. Seu olhar estava vago enquanto ela mergulhava em pensamentos. Ficou assim por alguns minutos, até finalmente ela abrir um sorriso e mais lágrimas saíram de seus olhos. Abraçou forte o marido e se aninhou no peito dele.
- Sim. Vamos conseguir. - E Gal afastou-se lentamente depois da última fala. Mesmo sendo tão novo, ele havia entendido grande parte do que estava ocorrendo ali. E tinha certeza que daria todo seu apoio ao pai, e principalmente, a mãe.

No outro dia, logo bem cedo, Mancy e Jeorge conversaram com Gal sobre o que discutiram na noite passada. Gal fingiu-se de desentendido e aceitou tudo com um forte abraço na mãe e no pai depois de ouvir eles falaram. Tinha orgulho deles, e sabia que não iriam perder para aquela gravidez de risco. Quando explicaram para ele, disseram que era uma doença rara, e que poderia causar sérios riscos durante uma gravidez. A vida de Mancy e do bebê estavam em risco caso decidissem seguir em frente. Mas, como Gal já sabia, eles decidiram por arriscar.
E dali em diante, as coisas voltaram a correr normais. Ou quase normais. Gal continuava a ir para escola e seu pai continuava a trabalhar. Mas a mãe que antigamente ficava sozinha em casa boa parte do tempo, agora estava sempre acompanhada de alguma amiga das redondezas. Também, as consultas dela ao médico eram bem mais frequentes que antes. Os dias seguiram-se desta forma, sem mais nenhuma alteração drástica. Meses se passaram, enquanto a barriga de Mancy crescia, junto de sua preocupação. Às vezes Gal a encontrava chorando em algum canto da casa, Jeorge também parecia mais estressado em certos dias. Compreendia o que ocorria em volta dele e tentava animar a todos. Muitas vezes, ele conseguia.

O dia tão esperado aconteceu no meio de outubro, Gal já havia se habituado completamente a escola e agora não a achava mais tão incrível quanto antes. Até mesmo a pista de skate tinha ficado enjoativa para ele. Voltava para casa no meio da tarde, depois de fazer um trabalho de escola junto do grupo dele. Já estava para abrir a porta quando ouviu algo quebrando lá dentro, seguido de um grito agudo.
Se jogou para dentro da casa com uma rapidez impressionante e deixou a mochila de lado. Não estava previsto para aquela semana, era cedo demais. Caso contrário, Mancy já estaria no hospital. Assim que Gal entrou na cozinha deparou-se com sua mãe caída no chão com a mão sobre a barriga enquanto se contorcia de dor. A amiga dela, uma velha vizinha de Gal, já estava ligando para a emergência enquanto voltava a se sentar ao lado da amiga.

- Gal, querido, não se preocupe... - Dizia Mancy, mas sua face de dor o fazia pensar justamente o contrário. Ela estava deitada sobre a maca, correndo pelos corredores do Hospital de Bluesky. Gal a acompanhava como podia, afinal, ele estava ali representando o papel do pai, enquanto ele saía correndo do trabalho para ir até lá. - Mamãe vai ficar bem. - E com isso ela entrou na sala de cirurgia e impediram Gal de continuar a seguindo.
Depois de quinze minutos, Jeorge apareceu quase caindo no corredor, já vestindo uma roupa apropriada para entrar na sala de cirurgia para acompanhar a esposa. Só parou antes da sala para se ajoelhar ao lado de onde Gal estava sentado. Ele segurou a mão do filho e tentou sorrir por de baixo da máscara.
- Tudo vai ficar bem, Gal.
- ... - Ele não respondeu.
- Hei... Não me olhe assim. É sério. Mamãe é forte, vai conseguir. E logo vamos estar aqui os quatro. Eu, você, Mamãe e Sarah. Han?
- ... - Tudo que Gal consegui fazer foi um movimento positivo com a cabeça. Jeorge o abraçou logo em seguida, para entrar correndo na sala de cirurgia um instante depois.
E durante as horas seguintes, o tempo pareceu uma eternidade para Gal. Ele simplesmente não esperava nada mais que seu pai e sua mãe saindo por aquela porta, o chamando para conhecer a nova irmã. Até lá, tudo era a mesma coisa. O corredor – que também era a sala de espera da sala de parto – estava imóvel, fora o balançar das pernas de Gal. Era de se esperar, afinal, não havia mais parente algum, fora os três. E não tiveram tempo de avisar nenhum amigo, devido a rapidez com que tudo ocorreu. A luz vermelha continuava acesa acima da sala, indicando que ainda não tinham terminado.

Os olhos de Gal abriram-se lentamente. Não havia mais sol na janela, e o hospital parecia ter ficado mais silencioso que antes. Olhou de lado e notou que haviam se passado duas horas desde que ele adormecera, estava cansado, com muita coisa na mente. E foi então que lhe ocorrera sobre o parto de sua mãe. Rapidamente virou-se para o lado, a luz ainda estava acesa. Não era possível demorar tanto assim.
Levantou-se, espreguiçando-se. As pernas estavam dormentes, e ele levou alguns minutos até elas voltarem ao normal. Olhou para os lados e decidiu tomar alguma coisa, nem que fosse para espairecer um pouco. E assim, saiu daquele corredor. O hospital já estava bem vazio naquela hora, pouca gente circulava por ali, e levando em conta que a cidade era pequena, parecia um prédio abandonado não fosse a luz ainda estar funcionando.
- Argh. - Bufou Gal consigo mesmo. Mesmo tendo relaxado o corpo, a mente ainda estava em pleno movimento. Afinal, quem não estaria tenso sabendo que a vida da mãe e da irmã corria perigo? Era de se esperar.
Desceu escadas e foi até o primeiro andar, onde finalmente encontrou o bebedouro. Ele acabou tomando quatro corpos d'água de uma vez só. Não tinha tomado nada desde a manhã daquele dia. E acabou, dali, notando o por-do-sol. Parece que na verdade o dia ainda não tinha se posto completamente. Gal escorou-se na janela e ficou ali aproveitando uma leve brisa que passava enquanto via a maravilha da natureza.
De certo modo, aquilo o acalmou um pouco. Trouxe um pouco de paz ao seu espírito, e com isso pôde realmente descansar a mente. Tanto, que nem viu o tempo passar, ficou ali por mais de vinte minutos, antes de jogar o copo de plástico no lixo e voltar a subir as escadas. Assim que virou o corredor, ficou boquiaberto. A luz estava apagada.

Esqueceu-se de todo o cansaço e correu para a porta, no exato momento em que dois médicos saíram. Eles pareciam exaustos, e não era para menos, fora uma longa batalha.
- Como eles estão? Mamãe e minha irmã? - Gal perguntou. Os médicos apenas lhe indicaram a entrada sem dizer nada, o que deixou o garoto com uma ponta de medo. Um mau pressentimento. Ele abriu a porta, dando passagem para enfermeiras que bloquearam sua visão instantaneamente. Então, naquele instante, o coração de Gal parou por um segundo. Jeorge estava caído de joelhos ao lado da cama, o rosto mergulhado na maca. Ele chorava alto enquanto murmurava muitas coisas para si mesmo.
- É tudo minha culpa. Só minha. - Dizia, quase que incompreensivelmente. - Se eu não a tivesse incentivado para continuar a gravidez ela... ela... - E se perdeu num mar de palavras sem sentido. Mas Gal tinha completamente esquecido de seu pai. Sua mãe estava morta. E Sarah também.
Leia até o fim...

domingo, 22 de novembro de 2009

Monólogo - 3


Preso em seu pequeno mundo de luz, o Pierrot. A cara pintada de branco, com contornos vermelhos exagerados em volta da boca e dos olhos. O espalhafatoso chapéu de Bufão, feito em cores alternadas de azul e amarelo; e a roupa, larga e folgada com grandes botões decorados. E também seu sapato com ponta empinada para cima e as luvas brancas gigantescas nas mãos. Lá estava o palhaço, sentado enquanto era iluminado por um único holofote.


Ficou desta forma por alguns bons segundos, até finalmente levantar a cabeça, direcionando-a diretamente para a luz. Passaram-se mais alguns minutos até ele finalmente sair da expressão vazia, ele sorriu.

- Do que você tem medo? - Falou. - Não há medo para os que não tem o que perder. Não há motivo para se ter medo quando você simplesmente... já não liga para nada. Vê?

E saltou de pé, começando a dançar pelo tablado de madeira. Passos de dança de um bailarino profissional e artista. Até finalmente parar na ponta dos pés, com os olhos fechados enquanto as mãos se portavam a frente do corpo.

- Não acham que sou feliz assim? - E abriu os olhos. - Feliz, como qualquer homem deveria ser! Sem seus medos! Afinal, quem gosta de sentir medo? De tremer nas bases no momento mais crítico? Ninguém! E é justamente esse o ponto. Eu.. perdi o medo de tudo. Então, eu sou nada mais nada menos do que um Ninguém. Algo inexistente e imperceptível a todos em volta. É lógico que a felicidade não me atinge. Não há como algo que não existe a tê-la!

Desceu da ponta dos pés lentamente, enquanto colocava a mão para trás. Observando a escuridão que o envolvia a todo instante.
- Por isso, não é certo não haver medo. Pois ele é a prova mais clara de que você ainda tem algo para proteger, e não quer perdê-lo. Para isso o medo existe. Ele é a prova da felicidade. - E abriu um sorriso, colocando uma mão sobre o queixo. - Alias, ótima coisa para se falar sobre: Felicidade. Vocês tem noção de como esse sentimento... essa emoção... essa sensação é? Podem explicá-la? O simples ato de sorrir, e de se deixar levar pelo lado bom de tudo. Ou simplesmente estar bem consigo mesmo. Ou tudo isso? Será possível diferenciar Felicidade de Alegria? - E puxou as mãos em frente à cabeça, abrindo e fechando-as, como se estivesse tirando algo da mente e espalhando para seu mundo de luz. - Sim. Claro. Mas eu não posso falar sobre nada disso, não com minha alma pútrida e seca. O porque de não dizer? É simples. Eu sou ninguém. E como tal não possuo o dom de ser feliz. Mas... mesmo quem tenha medo e assim, alma, mesmo eles, não podem também dizer sobre a felicidade. É algo tão complexo e ao mesmo tempo, simples, que adjetivos não podem dar qualidades a ela. Ela não pode ser taxada como um substantivo, tanto que é dita como abstrata. É simplesmente algo que você pode ter. Ou não pode ter. E que quando tem, você sabe que está sentindo mesmo que não possa ser narrado e descrito.

E ele travou do jeito que estava, sem mover um milimetro sequer. Ficou naquela posição novamente por mais um bom tempo, como se estivesse tentando agarrar uma mão invisível vinda da luz. Era o jeito do Pierrot, movido pelo que o seus sentimentos se tornaram. Tornando o corpo um reflexo do que sua alma degenerada tende a imaginar. - Mas, eu sou ninguém. E não posso sentir tal.

- Por isso, comecem a notar. Que todo o mal sentimento, advém de um bom. Quanto tem medo, é porque ainda tem algo que quer ter com você. Quando tem angústia e agonia, é porque você deseja estar de um jeito diferente do que você está. Quando tem tristeza, é porque você deseja que algo possa torná-lo feliz. E tudo, tudo, se interliga com uma única coisa final: Felicidade. No final de toda a cadeira e teia de sentimentos e sensações está ela. No final de tudo, ela é o desejo final de qualquer ação da qual você seja responsável. - E finalmente, saiu da posição, desmoronando no chão. - Não é engraçado? Lutar por algo que vocês não podem nem mesmo explicar o que é? Lutar pelo que pode mudar a cada segundo e a cada novo acontecimento? Pois é. Estes são vocês, minhas queridas falhas perfeitas. Porque eu sou ninguém. E como tal, sou perfeito. Nunca ouviram? “Ninguém é perfeito.” Este sou eu.

E levantou-se, lentamente. - Mas qual a definição de perfeito? Lógico, é algo que traga felicidade. É algo que seja feliz. Bom... - E puxou o chapéu de bufão da cabeça, mostrando os cabelos castanhos. - Como disse, no final, existe a amada felicidade. Só lamento dizer, que o perfeito não existe. E não existindo, também é perfeito. Só me resta dizer que o Perfeito é Perfeito. E assim, que a Felicidade é a Felicidade. Mas eu continuo sendo ninguém.

- Sabe como é? - Disse jogando o chapéu para fora do mundo de luz do holofote. - O negócio é que eu poderia ser feliz. Eu poderia deixar de ser um ninguém para voltar a brilhar. Para que todas as luzes de minha vida fossem acesas e eu pudesse correr livremente para onde quisesse. Para que eu pudesse ver o que está a minha frente e também o que estava atrás de mim, assim me dando uma noção sobre o meu futuro e meu passado. E não apenas do meu triste presente. Mas o fato...

Pierrot deu passos pesados e fortes, enquanto caminhava na direção do chapéu jogado. Até que a luz iluminou o chapéu e ele pôde pegá-lo do chão. O alcançou com uma mão para logo endireitá-lo sobre a cabeça.

- O fato é que eu não tenho motivação para essas coisas. Não tenho motivação para nada. Nada além de fazer minha função e ser meu eu sistemático e podre de sempre. Então... - E direcionou-se para o nada, apontando para aleatórios. - Então, por mim ou até mesmo por você mesmo, o que acho mais digno: Tenham Medo. Tenham agonia. Tenham angústia. Sofram. Chorem. Fiquem tristes e amargurados. Assim, vocês poderão Ter Alegria. Ter Liberdade. Irão Sorrir e Irão dar risadas. Melhor dizendo, vocês serão felizes. Ter sentimentos não é errado. Manejá-los de maneira pútrida é errado. Se evitarem a tudo, se tornarão inexpressivos. Se tornarão fantoches e palhaços. E suas vidas, serão limitadas a curtos mundos de uma luz fraca e opaca. Um simples holofote, muitas vezes. - E apontou para seu querido holofote. Para logo depois entrar na escuridão, sem que a luz o seguisse.

Imagem: The Stage by peacewisher222

Leia até o fim...

Não Feche

Agradecimentos para a Akina. Mesmo Meeesmo. Porque o poema saiu graças aos desenhos que ela faz. \o/




Sabe, acabei entendendo o grande segredo,
O segredo da força para vencer o medo.
Concentre, praticamente todos os seus esforços,
E de maneira alguma, feche seus olhos.

Compreendi que a vida pode ser mais colorida.
Uma questão de manipular. De aprender a controlá-la.
Agora, muito mais do que antes, eu suporto.
Mas de maneira alguma, feche seus olhos.

Subitamente, notei que tudo o que eu queria ter e ser
Não passavam de fúteis formas de me convencer,
Que o presente era imperfeito e o futuro apenas um colo,
Que de maneira alguma eu devia fechar meus olhos.

Imagem: shut your eyes by ~anglophilia

Leia até o fim...

sábado, 21 de novembro de 2009

Os 8 Escolhidos - Capítulo 3

Capítulo 3 – Uma noite na casa dos Walles

Quando Gal finalmente pôde se aproximar, o fogo já estava alto. Um incêndio assolava a casa dele e mais quatro casas em volta. Por um segundo, ele ficou sem saber o que pensar. Mas logo em seguida, afundou-se num grande pavor. Havia algo para salvar ali dentro. Passou da linha de bombeiros que seguravam os expectadores por de baixo das pernas de um deles e acelerou em disparada em direção a sua casa em chamas.
Por incrível que pareça, nenhum outro bombeiro conseguiu pará-lo a tempo. Era como dito, Gal às vezes parecia ser mais rápido do que o normal. Recepcionou a porta com um belo chute que a fez voar para dentro da casa e entrou sem nenhum medo para dentro da casa em chamas. As chamas pareciam terem começado já fazia alguns bons minutos, afinal de contas, partes do teto já caiam e tudo indicava que não iria durar muito mais tempo.

Gal cruzou o corredor correndo, tentando ignorar que mais chamas se criavam conforme ele avançava. A fumaça já cobria grande parte do corredor, de modo que ele andava com a cabeça para baixo para encontrar oxigênio. Ele já estava pingando suor quando derrubou a porta do quarto com outro único chute. Quase tudo já estava em chamas, mas mesmo assim, ele se dirigiu sem hesitação alguma até a escrivaninha dele e abriu uma gavela, puxando dali uma pequena proteção de couro negro que estava intacta. Ele se sentiu aliviado por tê-la nas mãos, virou-se para a porta no exato momento em que o teto resolveu desabar sobre ela. Agora não tinha saída para dentro de casa, teria de improvisar.
Rapidamente puxou o cobertor da cama e o envolveu entre os braços, tendo certeza de que não cairia com qualquer impacto. Tomou impulso e fitou a janela, sua saída de emergência. Correu o mais rápido que pôde e saltou sobre ela, fazendo o vidro e a moldura de madeira abrirem espaço para seu corpo passar. Ele caiu com tudo na grama do quintal. Não se passaram mais três segundos até um bombeiro surgir para segurá-lo.


- Você é maluco ou o que!? - Explodiu Jeorge dando um tapa na face de Gal. Ele havia chegado vinte ou trinta minutos depois da imprudência de seu filho. E agora, estava dando o devido sermão nele, assim como os bombeiros também fizeram. Mas aquela bronca era muito mais efetiva contra Gal. - O que diabos você foi fazer lá dentro!? Isso não é jeito de você jogar sua vida fora, Gal!
- Pai, eu...
- Não! - Gritou o pai, de pé em frente a traseira de caminhonete dos bombeiros na qual Gal estava sentado. - Não há explicações, Gal!
E logo seguiu-se um longo silêncio, que perdurou por bons minutos. Jeorge olhava para a grama chamuscada dos restos de sua casa, aquela na qual tinha vivido tantas emoções e tantas angústias naqueles últimos anos.
Finalmente, olhou para seu filho com o canto dos olhos.
- O que eu faria se você tivesse morrido, Gal? - O garoto o olhou nos olhos. - Me diga? O que seria de mim, se não tivesse você ao meu lado? Não me resta mais ninguém... Somos apenas nós dois. É por isso que...
- Desculpe. Pai. - E sem dizer mais nada, deixou o compartimento de couro sobre a caminhonete e abraçou o pai. O silêncio cuidou de aparar qualquer outra briga que eles poderiam vir a ter. Agora haviam se entendido. Finalmente.

Depois de alguns bons telefonemas e vários contatos feitos, Jeorge finalmente conseguiu a cabeça necessária para decidir o que fazer dali em diante. Eles ainda tinham o carro e Jeorge não estava desempregado. Faltava apenas a moradia, que a Família Walles fez questão de oferecer até que eles se restabelecessem.
Até tentaram achar algo que sobreviveu do incêndio, mas já estava escuro e ambos estavam cansados. Desistiram da tarefa e logo se dirigiram até a casa dos Walles, que não era tão longe dali. O Sr. E a Sra. Walles estavam na porta da casa os esperando com um grande sorriso. Era uma boa cena de se ver: O Senhor Walles era um gordinho baixinho bem humorado, todo o ânimo de Gary tinha sido puxado dele. E a Senhora Walles era um pouco mais alta e também era meio enchidinha, faziam um simpático casal. Atrás deles estavam Ann e Gary. O garoto estava sonolento, mas conseguiu dar algumas palavras de apoio ao amigo. Já Ann, estava completamente acordada, enchendo Gal de palavras a cada segundo. Ele mal podia distinguir uma da outra, mas agradecia pela preocupação da irmã de Gary. Já seu pai, Jeorge, estava cuidando dos detalhes com os Walles.

- Por favor, eu insisto!
- Negativo, Jeorge! Não somos hotel ou algo do tipo! Você vai ficar na nossa casa como nossos convidados, e por isso, não quero vê-lo pagando nada! Concentre-se apenas em no que você vai fazer daqui para frente, pense em Gal!
- Sim, mas é que...
- Fim de assunto, Jeorge! - E foi assim que a Senhora Walles conseguiu dobrar o pai de Gal. - Além de tudo, vocês devem estar muito cansados! Já preparamos as camas para vocês dormirem o resto da noite. Jeorge dormirá no quarto de hóspedes e Gal no quarto de Gary. - E antes que Gary pudesse comemorar. - E sem video-games e nem gritarias por lá!
- Mas mãe...
- Não quero ouvir mais nem um pio, Senhor Walles!
- Tá... Tá... - E assim Gary subiu para voltar a dormir. Talvez conseguisse dizer algo digno na manhã seguinte para Gal. Afinal, havia tomado um belo fora naquela noite, e por isso, não pensava em nada mais que diversão e em dormir. Jeorge tomou um banho antes de ir para o quarto dele, e Gal tombou no colchonete preparado para ele, mas só depois de finalmente conseguirem tirar Ann da porta. Depois daquilo, o silêncio reinou com todos dormindo.

Mas aquilo não durou tanto. Gal acordou de impulso, depois de um sonho ruim. Desta vez nem se lembrava direito qual era ele, mas já sabia que iria demorar a voltar a dormir. Ainda era madrugada, provavelmente ainda faltavam umas três ou quatro horas para amanhecer. O garoto ficou alguns segundos deitado no colchonete, até decidir por caminhar até a cozinha para beber algo. Levantou-se e calçou os chinelos para sair do quarto lentamente.
Seus passos solitários pareciam soar mais alto do que o normal, devido a falta de qualquer outro som naquela noite. Desceu as escadas sem pressa alguma e entrou na porta da direita para encontrar a cozinha. A geladeira estava aberta, e alguém inclinada sobre ela. Aguardou apoiado na porta para ver quem era, embora já tivesse certeza de quem era aquela pessoa.
Quando Ann fechou a porta com um prato com uma fatia de bolo na mão, ela quase saltou com o susto de ver Gal ali. Escondeu o bolo nas costas, numa tentativa inútil de inocentar-se. Gal apenas riu e caminhou até a mesa da cozinha para sentar-se numa cadeira.

- Vai acabar engordando, Ann.
- Nã... Não faço isso sempre! É porque eu não jantei direito e...
- Sei. Sei. - E antes que Ann pudesse interromper, completou. - Porque não coloca o prato na mesa e me arranja um garfo?
- Ora... - Mas não desobedeceu, pegou mais um garfo e sentou-se na mesa a frente de Gal. Logo colocando o bolo entre os dois, pegou um pedaço com o garfo e levou até a boca. - Não consegue dormir? Relaxe, vai dar tudo certo.
- Não é por isso que estou acordado...
- Não? Pelo que, então?
- Hah, é complicado demais dizer.
- Tudo bem, temos a noite toda para conversar. - Disse Ann, convicta.
- Na verdade, tenho uma prova amanhã. Então não temos a noite toda.
- Quem se importa com provas? Você já passou de ano, não passou, Gal?
- Bom.. Sim...
- Então! Não se preocupe e fique aqui abrindo seu coração para mim!
- ... - Foi a única coisa que poderia dizer. Não que falar de seus sonhos fosse algo vergonhoso ou difícil. Era só que, abrir seu coração era um termo forte demais para ele. E provavelmente até impossível. Ann pareceu notar isto. Ela deu um leve suspiro e levantou-se da cadeira, começando a dar leves passos pela cozinha.

- Sabe, Gal, eu me pergunto como você era antes. Se você sorria mais, Se você conversava mais e falava em voz alta. Daria tudo para entender você completamente, embora ache isso impossível para mim. Mas é só que...
- Ann..
- É só que eu gostaria de tentar mudar esse seu jeito de ser. Sabe? Afinal, você acima de tudo é um cara legal e eu... - E sua voz parou. Mesmo com tudo indicando o que a garota de dezessete anos iria dizer, ela nunca havia dito aquilo para ele. - Afinal eu...
- ... - Gal ficou alguns instantes quieto. Até finalmente soltar um longo suspiro, e ao final dele, soltar um sorriso para ela. - São sonhos, Ann.
- Como?
- Sonhos. Ultimamente tenho tido alguns pesadelos estranhos. Por isso eu acordo no meio da noite e não consigo mais pregar os olhos. Estranho, né?
- Que tipo de sonhos, você tem?
- Os mais esquisitos possíveis. Geralmente relacionados com guerreiros medievais, espadas e batalhas. Mas nunca com um final feliz, quase sempre o herói do meu sonho acabava com um final nada bom. Mas eles sempre acabam antes de eu ver o que aconteceu. Embora pudesse imaginar o que teria ocorrido.
- Sonhos medievais? Nossa, isso é completamente inesperado. Talvez seja influencia do seu nome, não? Galahad Broadcase?
- Não diga bobagens. - Disse, rindo bem baixo.
- E me diga, o que o herói enfrentava nesses sonhos?
- Esse é o pior. Nunca entendi o que eram os inimigos deles. Pareciam vultos negros, figuras disformes e inconstantes. Acho que nunca consegui entender como elas realmente eram. O meu sonho sempre acaba quando uma delas vai para cima do cavaleiro de armadura escarlate.
- ... - E Ann não conseguiu conter alguns risos. - Armadura escarlate e vultos!? Nossa, Gal, para alguém que não acredita em anormalidades, você é bem criativo, né?
- Vai ficar me zombando, é? Aqueles vultos eram reais. A maioria tinham mais de dois metros de altura e se movimentavam de uma forma bem estra... - Mas a voz de Gal morreu, do mesmo modo que seus olhos se arregalaram.

Na janela logo atrás de Ann, Gal tinha certeza de ter visto passar uma figura negra. Uma silhueta monstruosa e gigantesca que havia coberto toda a janela. Sua intuição, que geralmente era boa, estava palpitando a ponto de lhe causar dormência nos braços. Algo de muito ruim aconteceria, e ele tinha de fazer algo. Ann notou a feição do amigo e preocupou-se, também.
- O que foi, Gal?
- Abaixe-se! - Gritou ele, e a puxou para seu lado da mesa enquanto botava seu corpo na frente do dela com relação a janela. Logo caíram no chão, Gal por cima de Ann. Neste exato instante, a parede da cozinha atrás deles desmoronou como se uma pancada a tivesse atingido. O som alto soou e fez Ann ficar completamente desnorteada. Mas Gal sabia o que fazer, levantou-se com rapidez e puxando Ann pelo pulso começou a correr em direção ao hall de entrada.
- Vamos, Ann! Temos de fugir!
- O que!?
- Rápido. - E assim passaram da porta da cozinha. Gal teve tempo de olhar para trás por um instante, tempo suficiente para ver aquilo. Um Monstro. Uma gigante figura de dois metros e meio de altura e ombros largos e escamosos. Não tinha armas, mas seus punhos eram quase o tamanho do Senhor Walles. Sua face estava oculta na penumbra da noite, mas era possível ainda sim identificar os olhos vermelhos e malignos.
Gal tentou não lembrar da imagem e subiu as escadas junto de Ann. Algo dizia para ele que lá fora seria mais perigoso. Mal estavam no topo da escada quando Gary veio correndo até eles com uma cara de desentendido.
- O que aconteceu!?
- Explico depois, tome, pegue sua irmã e vá para o quarto! Vou avisar meu pai e os seus! - Mas não era necessário, eles já estavam praticamente ao lado deles. Haviam pulado de suas camas o mais rápido possível assim que ouviram o estrondo. - Senhor e Senhora Walles, Pai!
- O que aconteceu, Gal!? - Gritou Jeorge chegando até o filho, enquanto Ann era levada pelo irmão até o quarto.
- É algo... Uma coisa enorme.. Um monstro.
- O que!?
- Lá embaixo. - E Gal não precisou dizer mais nada. Naquele instante, a parede da cozinha desmoronou com mais um impacto de um soco do monstro que agora se encontrava no hall de entrada, de frente para as escadas. Jeorge e os Walles ficaram sem palavras por um segundo. Até Gal sentir seu corpo ser agarrado por Jeorge.
- Gal! Vá com Gary e Ann e tente fugir pela janela de alguma forma! Vão, rápido!
- Mas e vocês, pai!?
- Nós já vamos! Agora vá!
- Mas...
- Não quero ouvir mais nada, você precisa fazer o que estou mandando, Gal! - E com o grito, Gal notou o que ele queria dizer. Deu um forte abraço no pai e correu em direção ao quarto. Com o canto dos olhos, viu os Walles e Jorge conversando rapidamente enquanto tremores faziam tudo ficar pior.
Assim que entrou no quarto, Gary segurou Gal pela gola da camiseta com um olhar quase frenético.
- O que está acontecendo ali, Gal!?
- Precisamos fugir! Não temos tempo para explicações!
- Fugir do que!? Não estou entendendo nada! E minha irmã parece estar em outro mundo, olhe para ela! - E Ann realmente estava imóvel sentada na cama com os olhos arregalados. Talvez ela tivesse visto o que Gal também viu ao subir as escadas. Gal soltou-se de Gary e correu até ela, mas aparentemente não havia machucado algum, logo em seguida, virou-se para Gary.
- Olha, Gary, é sério. Não dá para explicar agora, temos de saltar pela janela de alguma forma e... - Mas neste momento um grito irrompeu vindo do corredor. Era o da Senhora Walles. Gary moveu-se quase voluntariamente, passando por Gal e indo em direção ao corredor enquanto Ann pareceu dizer algo, bem baixo.
- Gary! Não vá! - Disse Gal, correndo para o corredor atrás dele. Mas não foi muito longe, Gary estava parado, imóvel, no corredor, bem em frente a porta. Gal se posicionou ao lado dele para ter a visão do garoto. Ali, na frente, o Senhor Walles e Jeorge estavam tentando afastar o monstro com pedaços de madeira arrancados de alguma parte enquanto davam gritos para tentar assustá-lo. A voz do pequeno Senhor Walles parecia estar misturada com choro e dor, isso se explicava pelo corpo da Senhora Walles, jogado no corredor, um pouco mais na frente dos dois. Ela estava pálida e não respirava, completamente contorcida na parte direita do corpo, como se fosse atingida por uma bola de demolição naquela parte. O que não podia deixar de ser verdade. Jeorge notou os garotos apenas alguns metros atrás deles e gritou.

- O que diabos estão fazendo aí!? Saiam daqui!
- Gary! Leve Ann para longe, agora! É uma ordem de seu pai! - Gritou o Senhor Walles com as lágrimas encobrindo praticamente todo o rosto. Gary pareceu acordar de seu lapso com as palavras do pai, mas completamente desprovido de consciência. A ira parecia encher todo o corpo dele. Gal notou isso e antes que ele pudesse fazer alguma coisa muito estúpida, ele o segurou pelo pulso e o puxou com tudo de volta para o quarto. Uma força incomum fez o Gary não ter resistência alguma contra o puxão de Gal, sendo jogado para o quarto sem problema algum. O garoto logo se pôs de pé novamente, mas Gal já estava na frente da porta, com ela trancada atrás dele.
- O que você está fazendo, Gal!? Saia da minha frente agora!
- O que eu estou fazendo!? E o que você pensa que está fazendo!? Quer se matar!?
- E qual o problema!? Desde que eu acerte umas boas naquela coisa, está ótimo! Minha mãe está lá, Gal! Talvez ainda esteja viva e... e...
- Você sabe que ela não está... Gary.
- Mas...
- O que seu pai disse, Gary? Você precisa cuidar de sua irmã. Temos de sair daqui. -E finalmente aquelas palavras pareciam mostrar o grande significado delas para Gary. O pai deixou a irmã sobre os cuidados dele. Era uma responsabilidade que apenas ele deveria ter. Ficou alguns segundos em silêncio, até finalmente levantar-se e abrir a janela.
- Pegue os colchões e o seu colchonete. Vamos jogá-los pela janela para amaciar nossa queda logo depois. Não temos tempo, vamos! - Disse Gary, contendo as lágrimas. Gal assentiu, orgulhoso do grande amigo que tinha. E logo estavam jogando um colchão pela janela. Neste instante, Gal ouviu a voz de Ann.
- Gal... Gary... - Rapidamente Gal foi até ela e ficou na frente da garota.
- Ann... Está tudo bem. Logo vamos sair daqui.
- Gal... O que era aquilo?
- Não sei dizer. Mas precisamos sair daqui...
- Você e Gary vão comigo?
- Sim, Ann. Nós estaremos sempre com você. - E finalmente pareceu achar um sinal de raciocínio na mente confusa da garota. Era de se esperar aquilo. Para uma garota tão meiga e frágil quanto Ann, aquilo poderia ter sido demais para uma noite.Ou melhor, para poucos minutos. Gal segurou sua mão de leve e logo depois foi até Gary para ajudá-lo a jogar o colchonete pela janela. Já estava tudo pronto, era só saltar. E foi neste instante que a porta do quarto quebrou-se, e Jeorge fora jogado bruscamente para dentro do quarto. Ele estava com vários arranhões no braço e sangrava muito por uma ferida no ombro direito, mesmo assim levantou-se rapidamente. Ele estava sozinho, o Senhor Walles não estava ali junto deles. O pai de Gal rapidamente olhou para os meninos, a face numa mistura de medo e coragem juntas.
- Pela janela, Rápido! - Mas agora, era Gal que estava despreparado para fugir. Era seu pai ali. Aquele que ele sempre considerava como sendo insuperável e invencível. Estava sangrando, e ele teria de fugir e deixá-lo para trás. Para morrer, muito provavelmente. Não, não podia fazer algo assim. Rapidamente virou-se para os irmãos.
- Vão na frente! Vou ajudar meu pai a atrasá-lo!
- Não, Gal! Você vem com a gente! - Disse Gary, já segurando a irmã nos braços em frente a janela. - Nós três vamos sair daqui!
- Isto! Faça como ele disse, Gal! - Interviu o pai. - Não quero você mais envolvido nisso de maneira alguma! Eu não faço idéia do que seja esse monstro, mas... Eu não vou deixar ele destruir meu filho! Você deve ir com eles!
- Pai...
- Faça o que eu digo e vá! Agora! - Gritou o pai. - E saiba que eu nunca vou deixar de te amar, Gal, meu filho.
- Pai... - E recuou um passo em direção a janela.
- Vá logo! Tome... Pegue isso e vá! - E jogou para o garoto o compartimento de couro. Aquele que Gal havia arriscado a vida para salvar durante o incêndio. - Eu sei o que carrega aí. E me sinto orgulhoso de saber que você não me odeia, de verdade, Gal!
- Pai.... - E mais um passo fora dado.
- Ande! Gary e Ann tem força mas não eles não tem maturidade ainda! Você precisar estar junto deles! Vá!
- Pai...- E encostou-se na janela. - Eu te amo, pai.

E neste momento a parede do quarto rompeu-se levando os restos para porta para longe e dando entrada para o monstro, que agora pôde levantar-se. Afinal o corredor era pequeno demais para ele. Jeorge imediatamente se postou entre o grotesco e seu filho. Segurando com todas as forças possíveis uma cadeira que estava no quarto de Gary.
Gal deveria ter pulado naquele instante, afinal, Gary e Ann já estavam lá embaixo. Mas ele não o fez, e isso deu a ele uma das piores cenas de toda sua vida. O vulto negro levantou o braço enorme e o disparou contra o pai. A cadeira fora destroçada e o jovem Jeorge levou o impacto com tudo, sendo jogado até a janela. Até Gal. O garoto perdeu as forças para saltar para baixo e sentou-se ao lado do pai, os olhos mesclados em terror e tristeza. Lágrimas caíram de seus olhos.
- Pai!
- Idiota... Fuja logo daqui... - Falou Jeorge, tossindo sangue. Ele não podia mais mexer-se. Não tinha nenhuma ferida aparente, mas Gal e Jorge sabiam que provavelmente todos os ossos do corpo dele estavam em estados precários. Assim como os órgãos.
- Pai...
- Eu... fico feliz. De ter dado minha vida para salvar a sua. - Disse ele, tossindo mais sangue. - Talvez isso compense os erros do passado, não é, Gal?
- Não diga besteiras! Leia até o fim...

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Os 8 Escolhidos - Capítulo 2

Capítulo 2 – Desastres para todo lado

Como clara resposta por ter ficado acordado até tarde, Gal acabou se atrasando ao ir para o colégio. Seu pai, como de costume, já havia saído depois de deixar dinheiro para Gal. O menino só veria o pai novamente na próxima noite, ou talvez nem o visse.
A relação dos dois era realmente bem forte, e havia ficado ainda mais nos últimos três anos, depois de tudo que ocorreu. Ele já tinha dezesseis anos, adolescente, e mesmo assim, nunca brigaram feio.

- Ei, está me ouvindo? Gal?- Foi assim que ele foi interrompido de seus pensamentos por Gary. A aula mal tinha começado e ele já havia começado sua rotina matinal de incomodar seu grande amigo. Para a infelicidade de Gal.
- O que foi? - E antes que pudesse ser interrompido. - Caso for falar das garotas de novo, vai levar um soco na cara.
- Ora! Falando assim até desconfio da sua masculinidade. - Gary disse com cara de deboche. - Mas tudo bem, não é disso que quero falar. Você ouviu os boatos?
- Que boatos?
- Nossa! Cara, não acredito que você fica o dia todo em casa. Parece que nunca liga a televisão!
- Tá. Que seja. Diga logo o que quer.
- Você é sempre tão frio. Entendo porque não tem tantos amigos. Estava falando dos desastres em série que tem acontecido no mundo todo.
- Desastres, é?
- Sim! Tufões na Asia, Terremotos na Oceania e Tempestades na América. Não está sabendo de nada?
- Não. - E subitamente ganhou interesse pelo assunto. - Conte-me.
- É, né!? Agora quer me ouvir falar, né? Seu aproveitador!
- Largue de baboseiras e fale logo, Gary!
- Tá, Tá. Parece que uma série de catástrofes estão ocorrendo em todos os cantos do mundo. E para piorar, nenhum equipamento conseguiu prever nenhuma delas. Eles simplesmente surgem do nada. Fora isso, também estão acontecendo vários acidentes graves por todo o mundo. Ontem mesmo, tombou um ônibus escolar num lago, vindo para a cidade. Estranho, né? Tem gente dizendo que tudo está interligado e que é o fim do mundo.
- Nossa, Gary...
- Gostou, né? Quer que eu conte mais?
- Não. Na verdade pensava que você tinha ganhado algum pingo de inteligência. Mas já vi que era só ilusão minha. - E logo em seguida baixou a cabeça para voltar a dormir. Não demorou um segundo para levar um belo tapão de Gary. O amigo sentou-se na carteira ao lado e o encarou.
- Qualé! Você estava interessado até agora pouco!
- Sim, Gary. Mas você me conhece. Essas coisas supersticiosas não me afetam em nada.
- Claro, claro. Senhor Super-realista. - E tomou fôlego. - Mas isso não muda o fato que te contei algo interessante! Está me devendo uma!
- Já imaginava que era algo do tipo. - E Gal tomou forças para se espreguiçar em sua cadeira. - Não precisava de toda essa enrolação. Diga logo o que quer, Gary.
- Sabia que não ia me desapontar, cara! - E saltou da carteira para ficar bem na frente da face dele. - Arranjei um encontro com uma garota linda do segundo ano! Mas esqueci completamente que tinha de pegar umas coisas para minha mãe no escritório. Você conhece minha mãe, o escritório e minha casa. Não poderia...
- Claro. Vá curtir a noitada, Gary.
- Por isso que eu te amo, Gal! - E deu outro tapão no garoto. Desta vez fora retribuído com um soco no estômago que Gal soltou mais rápido que o esperado. Ele tombou no chão tomando fôlego enquanto soltava uma risada de vitorioso. Eles eram amigos já por dois anos, e sempre daquela forma. Gal nunca fora animado e muito menos carinhoso. Já Gary era extrovertido por demais. Acabavam formando uma dupla dinâmica perfeita.
Para a felicidade de Gal, logo depois o Professor entrou e a aula se iniciou, calando o amigo.

- “Tudo está interligado”. Grande besteira. - Disse com ar de deboche enquanto aproveitava a brisa noturna. Realmente, Gal conhecia bem a família de Gary. Fora praticamente o primeiro amigo do garoto desde que ele havia se mudado para a cidade. E com isso ganhou a simpatia dos pais e da irmã de Gary. O escritório ficava a menos de quatro quadras do colégio, e a casa a menos de cinco quadras do escritório. Não era uma grande distância, comum para uma cidade pequena como Bluesky. O mesmo motivo pelo qual o pai de Gal trabalhava na cidade vizinha.
Já estava com um grande bloco de papéis debaixo do braço, quando tocou a campainha da casa de Gary. A Sra. Walles abriu a porta, sorridente como sempre.

- Ora, o que faz aqui a essa hora, Gal? O Gary saiu e vai demorar...
- É. Eu tô sabendo. - E esticou a papelada para a Sra. Walles. - Por isso mesmo estou aqui.
- ... - Ela demorou alguns segundos para entender que o filho havia feito aquilo de novo. - Ora! Mas aquele Gary me paga! Te fazendo de empregado novamente! Venha, entre um pouco então, já que Gary foi tão mal-educado, posso retribuir.
- Hah. Não, obrigado, Sra. Walles, mas preciso ir para casa. Já é tarde e preciso estudar um pouco.
- Bom... Se você diz.
- É, infelizmente preciso ir.
- Tudo bem então, até mais.
- Até, Sra. Walles. - E se virou para ir embora quando ouviu a voz dela, lá de dentro.

- Gal? - E ele parou no meio do jardim. - Gal! É você mesmo! - E saltou da porta a garota. Era aparentemente mais velha que Gal, nada exagerado. Apenas um ou dois anos. Tinha cabelos castanhos e uma face lisa e bem cuidada, era bem o contrário de Gary, mesmo sendo irmã dele. Gal virou-se para a menina, ela ainda era mais baixa que ele.
- Olá, Ann. - E abriu um curto sorriso. Mesmo que não confessasse, ali estava outro motivo por ainda aguentar as travessuras de Gary.
- Ia embora sem falar comigo, é? Já faz tempo que não nos falamos, uma semana ou mais, não?
- Na verdade, quatro dias. - Disse, quase na frieza de sempre.
- Gal! - E inflou as bochechas. - Você tem que parar com esse seu hábito!
- Que hábito?
- De cortar as pessoas!
- Hah, claro. Já ouvi isso demais.
- Devia começar a fazer, ora!
- Se incomoda?
- Claro, seu bobo! - E fechou mais ainda a cara.
- Perfeito. - Disse Gal, com a face séria. Mas aquilo durou apenas alguns segundos, até ele não conseguir mais conter uma risada baixa. Ann riu quase ao mesmo tempo.
- É. Continue assim e nunca vai arranjar ninguém!
- Tudo bem, não estou a procura mesmo.
- Ora! - E deu um leve peteleco na testa dele. - Tenha um pouco de respeito e pare de responder assim, ainda sou mais velha!
- Tá. Desculpe. Mas agora preciso ir, mesmo.
- ... - Ela o fitou por alguns segundos até desviar o olhar. - Ok. Pode ir, eu deixo.
- Até mais, Ann. - E passou ao lado dela. Ela não respondeu, mas em troca, beijou a bochecha dele e correu para dentro da casa, fechando a porta atrás de si.

Já não era segredo que Ann tinha uma bela queda por Gal. Os dois se conhecem desde que Gal e Gary tinham se tornado amigos. E desde aquela época, parecia ter realmente algo entre eles. Nada confirmado, mas Gal não se incomodava com a idéia. Havia uma coisa especial naquela garota que fazia ele não se incomodar tanto com a presença dela, mesmo preferindo quase sempre estar sozinho. Talvez ela fosse a única que pudesse quebrar aquele coração gelado do rapaz. Afinal de contas, já fazia três anos que ele tinha ficado daquela forma. E, nos últimos dois que ele havia conhecido os irmãos Walles, tinha melhorado bastante.
Depois do agradável e curto encontro, Gal começou a voltar para casa. Ainda tinha dever de casa para fazer. Gal costumava sempre viajar nos pensamentos quando andava sozinho, e aquela era uma ótima ocasião. O cair da noite e a brisa melhorariam tudo. Mas por alguma razão, ele se sentia incomodado demais para isso. Como se alguém estivesse falando ao lado dele. Ou como se estivesse sendo seguido.

- ... - Olhou para trás. Mas não havia nada. Mesmo desconfortável, voltou a caminhar.

Estava a poucas quadras de casa quando notou grande movimentação mais para frente. Luzes estavam acesas e várias pessoas estavam saindo de suas casas para ver algo. Uma sirene pôde ser ouvida de longe, e logo, uma viatura dos bombeiros passou voando pela rua que normalmente era tão silenciosa. Ela virou na rua da casa de Gal.

Atiçado pela curiosidade o garoto apressou o passo.

Só para confirmar, não pensem que não escrevo mais nada. Projetos paralelos estão em andamento. Entre eles, dois contos e algumas idéias de poemas. Serão postados conforme eu terminar eles. 

Leia até o fim...

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Os 8 Escolhidos - Capítulo 1

Capítulo 1 - Gal

- Travem o portão! Não importa o que aconteça, Soldados de Khalador, estes muros devem permanecer impenetráveis! - Gritou o comandante por cima do grito dos outros, e como num coro, veio a resposta dos bravos guerreiros, fincando seus pés enquanto jogavam todo o peso para cima do grandioso portão de madeira, enfrentando bravamente os bruscos empurrões que vinham do lado de fora. Acima do portão, na grade muralha, centenas de arqueiros disparavam suas setas sem hesitar nem um segundo enquanto nuvens de vultos negros se formavam e se movimentavam o céu. Aquilo era uma batalha que poderia decidir o futuro de todos eles.

- Deixem-me passar! Deixem-me passar! - Um grande guerreiro abriu caminho entre os soldados. Ele portava uma gigantesca marreta de combate e parecia ter mais de dois metros de altura. - Preciso falar com Lorde Khalador imediatamente! - E assim enfrentou uma última corrente de guerreiros que estavam apenas cumprindo seu trabalho. Ele retirou seu capacete enquanto subia uma pequena rampa que ficava ao lado do portão. Lá no topo da rampa, havia um combatente vestindo uma armadura escarlate. A armadura reluzia grandiosidade para todos que a olhassem.

- Lorde Khalador! - O velho e grande guerreiro ajoelhou-se aos pés dele. - Não ouviu a trombeta, Lorde Khalador!? O portão do Leste foi invadido, em breve eles estarão aqui! Você precisa fugir, meu Lorde!
Seguido da fala do velho general, veio um longo silêncio que ignorava até mesmo os rugidos de guerra que ecoavam a todo instante. A resposta do cavaleiro Escarlate veio apenas segundos depois. 

- Não vou sair daqui. - Disse o Lorde.
- Mas senhor, precisamos salvar sua vida! Custe o que custar!
- E quanto a minha honra!? Pisar por cima dos corpos de meus guerreiros para salvar minha própria vida fugindo covardemente!? Não! Ficarei para lutar até o fim junto de meu exército! - Esbravejou o jovem guerreiro para seu general. O velho levantou-se e tocou o ombro de seu Lorde com uma feição seríssima.
- Sabe muito bem que é mais do que sua vida que se encontra em jogo, Meu Lorde! Caso sua vida espairecer, toda nossa esperança será em vão! Não se trata de covardia, se trata de dever!
- ... - Não houve resposta imediata de Lorde Khalador, ele permanecia pensativo.
- Meu Lorde! Por favor, não podemos perder mais tempo e...
- Tudo bem! Compreendi! Vamos indo! - Rompeu ele de seus pensamentos. O general que muitas guerras havia enfrentado sorriu, o único sorriso no meio de toda aquela batalha. Realmente, Khalador não era um Lorde qualquer. Fora o mais nobre que conheceu.

Lorde Khalador passou pelo General descendo a rampa e indo em direção ao castelo. O seu velho e experiente general foi logo atrás, agora uma tropa de dez guerreiros estavam seguindo eles. Mas de nada adiantou. Num piscar de olhos um vulto negro se colocou entre eles e Khalador. 




- Não! - Gritou Gal se levantando da cama de uma única vez. Respiração desequilibrada e olhos arregalados. Não demorou mais que alguns segundos até seu pai romper pela porta para correr na direção dele.
- Gal! O que foi? Tudo bem!? - Soltou as palavras automáticas enquanto via por si próprio o estado de seu filho.
- Não... Tudo bem, pai. - Já recuperado do susto, disse ele entre pesadas arfadas de cansaço, estava encharcado de suor. - É só... Mais um pesadelo.
- Outro, Gal? Já foi o quinto deste mês... - Disse ele logo que ouviu as palavras do filho. - Está tudo bem mesmo com você, Gal? Na escola? E tudo mais? Isso deve ser reflexo de algum problema seu ou...
- Não, pai. Está tudo bem...
- Tem certeza? Pode contar para mim, Gal. Afinal somos só nós dois.
- Sim, está tudo certo. É só... Estranho. Esses sonhos.
- Guerras de cavaleiros novamente?
- Sim.

O pai suspirou com a resposta do filho. 
- Gal, tem certeza que não quer ir no psicólogo? Podemos ver a causa de tudo isso.
- Não. Não é nada demais, Pai. Não precisa se preocupar com isso. - E acabou se lembrando que era a primeira vez que via o pai naquele dia. Afinal, desde que só eram os dois, o Pai tinha trabalhado mais do que duro para sustentá-los. Eles acabavam que só podiam conversar em ocasiões como aquelas. Ao acaso. - Alias, como foi seu dia?
- Bom, nada de mais. Os relatórios extras estão me rendendo uma boa grana. Por isso, acho que vamos poder viajar no final desse ano. - E sentou-se ao lado do filho. - Só nós dois, né?
- É, pai. - Disse, sorrindo para ele.

E depois daquele incidente, eles conversaram por mais meia hora, até finalmente o pai notar o quão tarde já era. Gal dormiu feliz, não era sempre que falava tanto com Jeorge, seu pai. Acabou ignorando completamente o vulto negro que havia se movido bem em frente a janela de seu quarto. 

Bom, este é o primeiro capítulo de uma grande história que pretendo terminar. Espero que a história interesse vocês. É do gênero ficção/aventura. 

Leia até o fim...

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

A Cada novo dia...

Tá, talvez eu esteja apaixonado e não sei. Não é possível! Já é o segundo! AOSHDASOIHDAIOSDHIOA :x


Desta vez digo, entendi completamente. 
Que a cada novo dia que sigo ao seu lado,
Mais e mais coisas simples, me fazem contente.
Ou seria isso, apenas por você ter me aceitado? 

Agora me chamam de bobo apaixonado, 
E também, falam que eu vivo fora do chão. 
Mas para falar a verdade não me sinto insultado. 
Não quando penso nas semanas que ainda virão.

Você não sabe, mas comemoro comigo mesmo, 
Sempre que de você descubro algo novo. 
Sempre que por você, fico totalmente surpreso. 
Desapareceu a preocupação de parecer um estorvo. 

Desta vez digo, entendi completamente. 
Que a cada novo dia que sigo ao seu lado, 
Mais o mundo me parece algo surpreendente. 
E notei como você me deixou tão avoado. 

Desta vez digo, entendi completamente. 
Que a cada novo dia que sigo ao seu lado, 
Meus risos se tornam algo cada vez mais frequente. 
Por isso, para você, só tenho a dizer: Obrigado.  



Imagem: Stand by me by =AndromedaII

Leia até o fim...

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Novos Passos


E talvez sobre a trilha cruzada
Nada mais seja
novamente visto,
Nada mais seja novamente possível.
Sempre temos novos horizontes a cada nova passada. 

E com antigas derrotas. 
Aprendemos sobre a limitação.
A limitação que todos nós temos. 
A vida ensina-nos sobre o quanto você suportas. 

E com novas vitórias 
Aprendemos sobre nossa capacidade, 
Sobre nossa força de superação. 
Estes versos retratam, nada mais que vidas simplórias.  

...que vidas que nos passam despercebidas 
A cada nova cruzada. 

Imagem: Lost and Found by =Healzo


Leia até o fim...

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