quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Infinitas Máscaras




- Olá, Benny.

A voz falou pra mim. Como se mais nada tivesse para se ocorrer numa noite chuvosa e triste. Ela veio do nada, como se meus próprios ouvidos estivessem criando os sons para que eu pudesse ter algo para ouvir. Olhei para os lados. E nada apareceu em vista.

- Faz tempo que não me ouve.
- E quem é você?
- Seu amigo. Talvez o primeiro que teve.
- Como?
- Exato. Nas noites mais tenebrosas, eu lhe dei a paz necessária para fechar os olhos e dormir tranquilamente. Nos seus dias mais tristes, eu lhe dei a sabedoria para seguir em frente. Nos seus momentos mais críticos, eu lhe antecedi, lhe empurrando e dando-lhe coragem. E talvez, até nos seus dias mais normais, eu estava presente. Sempre estive. Mas agora, parece não mais me ouvir.
- Como é!?
- Viu só? Chega a ser tão simples, que você mesmo prova isso para mim.

Aquilo estava ficando cada vez mais louco. Eu não me lembro de ninguém. Nunca houve alguém daquele jeito, que esteve presente ao meu lado desde meu nascimento. Quero dizer, meu pai morreu quando eu ainda era um pivete, e era um bêbado desgrenhado antes disso. Já a minha mãe, trabalhava tanto para me dar um pouco de comida que quase não a via na casa. Ela não era uma mãe presente, embora não tenha do que culpá-la. Me virei novamente, levantando-me do sofá e vendo se realmente não tinha mais ninguém.

O que mais curiosamente me chamava a atenção. Era que. Eu não temia. Simplesmente não conseguia ter medo de uma voz misteriosa e sem dono.

- Tudo bem. Tente ser mais claro para mim.
- Eu surjo, sempre que você mais precisa de mim. Não há outro momento para eu aparecer.
- Do estilo... Uma fada madrinha?
- Mais que isto. A minha ajuda não mé mágica. Apenas sussurro o que precisa saber para que você mesmo faça o que é certo. Uma fada madrinha não lhe cobra este esforço, e te deixa fraco. Isto, eu não faço. Alguém que evolui, deve assim se fazer, sozinho. E sem ajuda de ninguém.

Não compreendia onde ele queria chegar daquela forma.

- Então, o que diabos é você?
- Sou algo que você destrói sempre que ergue a voz. Sou algo que se refaz sempre que o som se esvai. Sou algo que pode ser o terror, e também a paz. Muitos são meus nomes, embora um em especial me agrada.
- Você só pode ser louco.
- É outra de minhas alcunhas. Também posso trazer a loucura. Como também posso fazê-la parar. Basta um outro ponto de vista e você verá outra de minhas infinitas faces.
- Tá. Chega. O que é você!? Diga, ou me calarei!
- Se cale, então.

Ele duvidou, e eu assim o fiz. Fechei minha boca e não disse mais uma única palavra. Mas logo a voz dela voltou, agora, mais alta e poderosa que nunca. Quase chegando a ser ensurdecedora.

- QUANDO CALADO, EU CRESÇO!
De imediato, pus as mãos sobre os ouvidos e me encolhi no sofá.
- Diga de uma vez! O que é você!?
- Ainda não percebe? Benny. Eu sou o silêncio.
- O Silêncio?
- Exato. Nota agora, minha presença?
- Mas... como diabos, silêncio!? Não tem lógica. É algo abstrato.
- Pareço abrstrato?
- Parece.
- Então eu assim sou. É outra alcunha minha.
- Não, sem mais enigmas, me diga, me explique, porque o silêncio está falando comigo?
- Porque finalmente, me deu a chance de falar com você. E isso, Benny, pode ser sua salvação. Como também pode ser sua última queda. Isso depende de você.
- Depende. Depende. Depende do que?
- De como reage a minha presença. De como reage ao ato de mais nada existir ao seu redor, a não ser a minha vida. A não ser minha magia. O que faz sobre isto, Benny?
- E eu vou lá saber!?
- Deveria. Está escrito no seu coração. E só você pode ver, de dentro da sua alma.
- Alma!? Está louca. Só pode.
- ...
- O que!? Agora quer ficar calado, é!? Vamos, levante-se.
- ...
- Parece que lhe calei, não!? O que foi, estou falando alto DEMAIS!?
- ...
- Vamos. E agora, porque não fala, Silêncio? Hah! Já sei, assim você desaparecia não é!? Só pode ser loucura sua, aparecer assim! Ainda mais no meu estado! Já não tenho mais nada. Minha esposa me deixou, minha filha morreu e meu negócio foi para a merda! Nem mesmo esse puto sofá é meu!

E me levantei apontando para meu cômodo. Ex-Cômodo.

- Agora, se você está sempre ao meu lado, me apoiando, me aconselhando e me dando coragem, porque não apareceu!? Era a hora que mais precisava de você! O pior momento da vida que eu tive! E você não estava lá, simplesmente não estava. Porque, responda-me!
- Não estava, Benny. Pois você não me permitiu.
- Como é?
- Sempre que me aproximava, você me jogava para o lado. Se iludia. Se destruía. Se dilacerava sem notar que assim o estava fazendo. E ainda o faz.
- Besteira! E-Eu... Eu sempre tive tempo para você!
- Teve, Benny. Mas não respeitou isso. E agora, o que teu coração diz, já mostra como devo me por diante de você. Sua alma pediu pelo seu destino, e aqui estou, para dá-lo.

E depois daquele dia, fui internado num hospício. Sempre que me calava, o Silêncio gritava na minha mente. Explodia meus tímpanos, quando na verdade não ouvia nada. E quando eu destruía o silêncio com gritos, me injetavam toxinas. Me dopavam e eu dormia. Onde o silêncio me dominava por completo e me dava os piores pesadelos que jamais tive. Foi talvez a pior época de minha vida. O silêncio é lindo, mas certas vezes, ele pode ser o mais macabro dos seus inimigos.


Imagem: -SiLeNCe- by =day-light

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