sexta-feira, 21 de agosto de 2009

A Planície Infinita


Depois de cinco minutos, enfrentando toda minha vontade de voltar a dormir, abri os olhos. O lençol cobria a minha face e o ventilador parecia estar ligado bem na minha cara, pela ventania que fazia. Me espreguicei com vontade e finalmente saltei da cama, puxando o lençol de cima de mim.


- Mas que diabos... - Falei. Mas não terminei a fala.


Na minha frente, onde era para estar meu pequeno e aconchegante quarto, havia uma planície verdejante que cobria tudo o que meus olhos podiam observar. Fora o céu. Mas meu quarto tinha um teto, e não tinha grama. E definitivamente não era grande daquele tamanho. Dei alguns passos adiante daquele mundo estranho, quando olhei para trás. Minha cama estava lá. Ótimo. Pensei. Teleportaram minha cama comigo junto. Era uma hipótese maluca e sem nexo algum, mas o que você pensaria numa situação parecida com a minha? Imagine se você cochilasse na sala de aula e acordasse no meio de uma floresta. Era assim que eu estava.


Finalmente, depois de alguns segundos olhando para minha cama, voltei a olhar para o horizonte e comecei a caminhar. Foi uma caminhada longa, e eu não sabia exatamente quanto tempo havia se passado desde que eu a havia começado. Quando você não tem um relógio, e todo o cenário parece ser sempre o mesmo do anterior, você começa a perder a noção de tempo. Mas tinha certeza que já estava longe, pois não via mais minha cama.


- Ei! Tem alguém aí!? - Gritei. Sem resposta alguma. Agora, minhas pernas doíam de tanto andar.


Mas mesmo assim continuei caminhando por aquela planície. O sol aparecia hora ou outra, mas quase sempre estava coberto pelas nuvens vistosas do lugar que era para ser meu quarto. Sempre gritava, talvez na esperança de alguém aparecer para me dizer o que está acontecendo. Ou na esperança de minha mãe me acordar de um sonho muito doideira.


Mas minha mãe não me acordou, e finalmente, alguma coisa aconteceu naquela imensidão verde. Vi ao longe um pequeno pontinho amarelo se aproximando. Parei, aguardando-o. Conforme ele ia se aproximando, ia tomando mais forma. Era alguém montado em cima de um cavalo. Naquele momento comecei a pensar se era melhor esperar ele chegar, ir até ele ou fugir de volta para minha cama. O fato é que de tanto que me demorei pensando nisso, ele se aproximou sem mais problemas.


- Gostou da nova decoração do seu quarto? - Veio a voz velha e arranhada, mas com o vigor de um garoto de doze anos de idade. Da minha idade.


O velho senhor tinha um bigode grande que dava pequenas voltas em torno de si mesmo antes de finalizar-se. Usava um chapéu marrom com uma pena fixada nele, ao melhor estilo Robin Hood. O resto da sua vestimenta; que incluíam uma calça folgada presa para dentro de botas, uma camisa de seda e uma capa por cima delas; eram todas amarelas. Fora o seu cinto, que era branco com uma fivela dourada em forma de cabeça de touro. Tanto seu bigode quanto seu cabelo eram brancos da idade, mas ele parecia muito bem em forma. Demorei um pouco para respondê-lo.


- Isto aqui é meu quarto? - Perguntei.

- Mas é claro, onde mais seria!?

- Tipo, sei lá. Uma Planície de um universo paralelo seria uma ótima opção, não seria?

- Como sempre, seu senso de humor é divino, garoto! - Disse o velho, seguido de uma risada bem humorada.

- Não, é sério. - Naquele ponto da conversa estava acreditando em qualquer coisa.

- Sim, eu sei que fala sério, meu pequeno.

- Ótimo. Então, vamos começar desde o começo, certo? O que é aqui?

- Depende do ponto de vista.

- Do ponto de vista normal. - Respondi automaticamente.

- Estamos no seu quarto. - Falou o velho com um sorriso na face.

- Tá... - Disse, pensando um pouco. - E do seu ponto de vista? - Arrisquei.

- No meu ponto de vista, este é um mundo maravilhosamente lindo e silencioso! - Ele falou abrindo os braços aos céus, mostrando as luvas de couro, também amarelas.

- Isso não ajuda muito. - Respondi finalmente.


O velho cavaleiro amarelado pareceu notar minha confusão e desceu de seu cavalo branco, logo colocando a mão dele sobre meu ombro.


- Relaxe. Não há nada aqui que irá lhe fazer mal. Até porque, tudo aqui é assim.

- Tudo assim?

- É.

- Tudo assim, tipo, quieto, com a grama baixa e o céu limpo?

- Exatamente. Pelo menos, na maior parte do tempo.

- E você mora por aqui?

- Sim. Sou o Guardião desta terra.

- Mas que terra é esta?

- O seu quarto, no ponto de vista normal.


Desisti, bufando por um momento. E assim, um longo minuto de silêncio nos cobriu, como se todo o assunto que tínhamos para conversar tivesse se esvaído. O velho cavaleiro continuou com a mão no meu ombro, olhando, hora para mim, hora para o céu azulado. Sempre com a mesma expressão sorridente. Enquanto eu fiquei ali; parado, imóvel. O que eu tinha para falar, afinal? Olhei para ele, pela face que ele fez, eu estava com uma feição meio triste.


- Vou ficar aqui para sempre?

- Ora, meu jovem... - Disse ele. - Você fica sempre no seu quarto?

- A maior parte do tempo, sim. Isso significa que a maior parte do tempo vou ficar aqui?

- Mais ou menos. Isso depende do ponto de vista, também.


Novamente me calei. Mas desta vez, por apenas alguns segundos.


- Eu estou sonhando, não é?

- Depende do...

- ...do ponto de vista. - Finalizei a frase para ele. O cavaleiro sorriu, como se eu tivesse feito algo bonitinho para ele.

- Exato. E se você for parar para pensar, pequenino, tudo na vida depende de um ponto de vista. Ás vezes o que é bom para um, é péssimo para outro. Pontos de vista. Já parou para pensar nisso? Esta planície é maravilhosa, um músico adoraria parar para pensar por aqui quando desejasse. Já você, que veio para cá tão repentinamente, não sabe ainda o que pensar.

- E outros já vieram para cá?

- Depende do ponto de vista. Também.


Parei para pensar num instante. E finalmente, achei uma boa brecha.


- No meu ponto de vista. - Respondi. O velho cavaleiro abriu um grande sorriso.

- No seu ponto de vista... - Ele respondeu, quase cantarolando. - Várias pessoas já passaram por aqui. De inúmeros lugares, de inúmeras eras.

- E quem é você? - Perguntei. E finalizei: - No meu ponto de vista.

- Parece que finalmente as coisas ficaram mais claras agora, Hm?

- Pois é. Agora responda-me. - Disse meio impaciente. Não queria parecer estar assim. Mas se você estivesse numa situação parecida da minha, também iria querer logo uma resposta. O cavaleiro pareceu notar essa minha pressa, pois fez uma longa e demorada reverência para mim, e começou a falar lentamente, num tom de voz diferente da anterior.


- Eu sou Lorde Túlio. Guardador da Infinita Planície.

- Lorde... Túlio?


De alguma forma aquele nome me pareceu muito familiar. Já havia o visto em algum lugar. Talvez o tenha ouvido quando era menor. Ou talvez o tenha escutado em algum lugar, não há muito tempo atrás. De modo que quase me esqueci da presença de Lorde Túlio, enquanto mergulhava nos meus pensamentos. Voltei a olhar para ele, nos seus trajes amarelos. Ele parecia querer dar continuação à nossa conversa. Sorri para ele.


- Então, Lorde Túlio. - Disse, já convencido. - Que lugar é este? No meu ponto de vista?

- Isso depende de qual ponto de vista você usar, meu jovem. - Respondeu ele, cortando meu barato.

- Mas como...

- Posso lhe dar uma demonstração do que falo, meu rapaz? - Disse ele antes que eu pudesse finalizar minha frase. Não que ela mudasse muita coisa, já que eu continuava bem confuso.

- Tudo bem. Me mostre, então.

- Perfeito!


Disse ele, e logo em seguida subiu em seu cavalo branco. Ajustou um pouco a sela do cavalo e em seguida estendeu a mão para mim. Era a primeira vez que eu montava num cavalo, mas a sensação não foi ruim, exceto pela sensação do meu traseiro ficar pulando a cada trote. No início, andávamos lentamente apreciando a vista. Eu sentado na frente, e as mãos longas e fortes de Lorde Túlio ao meu lado, segurando as rédeas.


- Bom, vamos começar nossa pequena jornada, meu jovem.


E antes que eu pudesse perguntar do que ele estava falando, Túlio atiçou seu cavalo que começou a correr mais rápido. E mais rápido. E mais rápido. Tão rápido que chegou uma hora que tudo ao meu redor pareciam ser só grandes borrões de tinta. Não tinha como um cavalo ter aquela velocidade, mas também não tinha como uma planície ser meu quarto. Demorei alguns segundos para me acostumar com o vento batendo na minha face assustadoramente. Olhei para trás e Lorde Túlio estava intacto e sorridente. E de alguma maneira seu chapéu continuava preso na sua cabeça.


- Não perca os detalhes, meu jovem!


Falou Túlio. Demorei para entender do que ele estava falando, e foi só então que notei. Os borrões que passavam por nós, não eram borrões azuis e verdes, como eram para ser caso corrêssemos nessa velocidade na planície. Era difícil me fixar em uma só imagem, quando parecíamos correr tão rapidamente. Mas Túlio ignorava essa minha dificuldade, então, imaginei que eu deveria observar daquele jeito mesmo. Forcei a vista com tudo.


- ....!!


E finalmente gritei de espanto, quando uma imagem se fixou. Era o Grande e Invencível Guerreiro Lothar, junto de seu escudeiro Fig. Eles estavam enfrentando uma montanha de monstros que não paravam de vir em cima deles. Mas a imagem foi tão rápida que logo foi substituída por outra. Agora, eu via um pequeno garoto usando boina, camisa e calça social. Era Thomas, brincando no seu silencioso balanço. Virei para outro lado e vi Lorena, a princesa, sendo resgatada pelo seu grandioso chefe da Guarda. Eram todas imagens conhecidas. Para todos os lados que virava, novas imagens. Até que finalmente o cavalo começou a reduzir nos trotes. E pouco a pouco, os borrões se tornaram verdes e azuis novamente. Até que finalmente a corrida voltou a ser caminhada e eles voltavam a trotar sobre a Planície Infinita. Mais ali ao longe, a minha cama.


- Obrigado, Lorde Túlio. - Disse, virando-me para o cavaleiro amarelo. - E desculpe por ter me esquecido de você. É algo imperdoável, eu sei. Mas...

- Ora! Por favor, meu jovem! Relaxe e procure apenas continuar sua vida.

- Sim, vou tentar.


E desci do cavalo com a ajuda dele. O Lorde desceu em seguida, e fomos caminhando juntos em direção à minha cama. Assim que chegamos a beira dele, virei-me para o Cavaleiro amarelo e o abracei com força. E logo depois, me deitei na cama. Túlio se sentou ao meu lado, na cabeceira da cama.


- Lorde Túlio.

- Sim?

- Isso foi é um sonho, certo?

- Depende do ponto de vista, meu rapaz.

- Imaginei que essa seria a resposta. Obrigado.


E em seguida, fechei os olhos para dormir. De repente parecia tão cansado e sonolento que não demorei mais que dez segundos para adormecer ali. O sono pareceu durar uma eternidade, e quando acordei novamente, foi com minha mãe me chacoalhando forte na cama. Abri os olhos e suspirei. Estava de volta no meu quarto. Olhei de relance para a estante onde estavam os meus livros. Tanto os que li quando os que eu criei. E logo depois, olhei para uma gaveta antiga. Onde dentro, havia um desenho de criança. Um desenho de um cavaleiro corajoso, valente e bondoso. Mas na ocasião em que o desenhei, anos atrás, só tinha um lápis amarelo. A viagem para minha própria imaginação foi algo estranho, inesperado, fantástico, inesquecível e completamente nostálgico. E a sensação de conversar com Lorde Túlio, o primeiro personagem que criei, foi incrível.





A imagem usada na postagem é do seguinte Artista:

http://kkart.deviantart.com/art/Mountain-Plains-of-Tabernash-93876809

3 comentários:

  1. Nossa, q style, véio, c isso aconteceu mesmo e vc c lembra deve ser uma emoção mto foda, um passeio d cavalo pelo seu próprio cerebro é uma experiência unica, tem os textos dos seus personagens ? imagens essas coisas ?

    Peço por favor que comente no meu também, ok ???
    http://escolhaopcional.blogspot.com
    Obrigado Mesmo !

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  2. *O*
    Muito foda, Mr. Tadashi!

    Esse eu desenharia com prazer!

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