sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Curtas Literárias - Gênese


Gênese

As mãos deslizaram no nada, brincaram no vácuo do silêncio. E acompanhando seus leves toques, seus curtos e mínimos moveres dos dedos, aos poucos, surgiu a luz por de trás de um horizonte de vazio. Um punho se fechou num brusco movimento, e a luz parou junto dela; o indicador da mão oposta, meio segundo depois, com distraídos brincares, deixou pingos aleatórios. E dos pingos, surgiram pequenas gotas de verde que começaram a se espalhar, tal qual a água de um jarro que é virada num único e contínuo filete, esbanjando de sua vitalidade transparente e transbordante no ponto em que tocava o solo negro.

E então, de súbito, as mãos se levantaram ao ar; fortes, graves, retumbantes, vívidas e onipotentes. Eram indestrutíveis, eram mãos de um Criador. E conforme seus fortes e bruscos movimentos se faziam, o mundo começou a se formar da mesma forma. E do nada, brotavam então florestas, rios, montanhas e mares conforme os braços dançavam no que agora, não era mais um nada, mas sim uma maluca – e ao mesmo tempo tão sábia - e descontínua – e ao mesmo tempo tão contínua – gênese.

Depois de infinitos segundos contados e precisos, em que as mãos do Criador se moviam de um lado para o outro inventando o mundo em que nem mesmo as palavras ainda existiam, seus braços, cansados e que procuravam por um alento; tomaram uma forma contínua, e a vida lentamente tomou um curso uniforme e calmo. E com este caminho de pedras tão linear, o mundo conheceu o tempo, e com o tempo, surgiu ali o dia e a noite. E dos dias vieram os tempos de vida árida e os terremotos, e das noites surgiram as tempestades e as enchentes. E o mundo começou a ganhar experiência, e forma, muita forma. Uma forma disforme, uma vivacidade que pendia entre o paradoxo e o tão óbvio. As mãos do Criador continuavam a se mover, e quando paravam, elas nunca realmente paravam. Pois eram como as pausas, os contra-tempos da dança.

E quando o mundo já havia tido de tudo, e quando o mundo finalmente conhecera o tempo e como ele moldava as coisas, e como ele criava e destruía tal qual fazia o Criador em escalas menores; as mãos, abertas e levantadas para o ar, se abaixaram bruscamente. E junto das mãos se abaixando, foi-se a luz, foi-se o mundo, foi-se o tempo.





O balúrdio sonoro viera de trás dele. Virou-se de frente para o público, ao mesmo tempo em que voltou ao casulo em que sempre se prendia. Esse, do qual só conseguia se livrar quando a orquestra era por ele regida. Estava ali, O Maestro.

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