sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Monólogo - 2


- Destino, Acaso, Ódio, Amor, Felicidade, Tristeza, Alegria, Saudade, Sofrimento, Dor, Amizade, Bem, Mal, Morte, Vida, Lágrima, Sorriso, Assim como várias outras palavras. É possível uma definição concreta para elas? O dicionário faz seu trabalho, explicando todos os sentidos delas? - Soou a voz na escuridão. 

- Diga-me você. Consegue explicar por completo cada uma delas, e diferenciá-las uma das outras? - Afirmou a mesma voz sofrida. 


A Luz se acendeu novamente no centro do palco, e lá estava ele. Preso em seu pequeno mundo de luz, o Pierrot. A cara pintada de branco, com contornos vermelhos exagerados em volta da boca e dos olhos. O espalhafatoso chapéu de Bufão, feito em cores alternadas de azul e amarelo; e a roupa, larga e folgada com grandes botões decorados. E também seu sapato com ponta empinada para cima e as luvas brancas gigantescas nas mãos.  

- Mas é claro que não. - Finalmente finalizou seu pensamento, o Palhaço. Estava daquela vez sentado, a cabeça abaixada e os braços soltos no colo. Como se estivesse sem vida. - As palavras são o mar em que vivemos. Mas assim como todos os mares, existem partes completamente desconhecidas. A definição de algumas palavras, que ás vezes parece tão óbvia, é algo que pode ser discutido... - E ele levantou a face, e junto desta, o braço esticou-se em direção à luz. - ... Por uma vida inteira.

Logo depois abaixou ambos novamente. Voltando a parecer um boneco inanimado. E manteve-se daquela forma por alguns segundos, até que ele saltou para frente, mostrando claramente uma pirueta no ar. E como sempre, a luz que o prendia o seguiu. - Posso afirmar a vocês, meus caros... – Falou apontando para o nada. - ... Que mesmo em toda minha sofrida vida que já tive, não pude completar nenhum pensamento sobre as palavras. 

- Palavras. Elas não tem poder algum. Pelo contrário. São frias, incertas e sem emoção. O que realmente tem poder, é o significado delas. - E abriu um sádico sorriso. - Mas o que mais as palavras retratam, além de tudo aquilo que sentimos? Então, seria a nossa existência algo sem limites?

E esperou alguns segundos. Antes de despontar, voltando a cair lentamente enquanto dava passos pelo palco. Seu mundo iluminado o seguiu, sendo sua única espectadora. O Pierrot não a desejava, tentou afastá-la com as mãos. Mas aquele era seu eterno fardo. Impossibilitado, fechou os olhos e tentou se rastejar pelo chão, fincando seus dedos na separação entre cada tábua que preenchia o palco. E assim tentou por longos minutos, ou segundos... Até finalmente desistir e se manter jogado ali. 

- Não. Nós humanos, não somos nada de tão grandioso. Temos nossos próprios limites, postos justamente por aquilo que mais nos liberta. Nunca haverá alguém que puramente se expresse, nunca, pois no seu antro, bem no fundo, sempre haverá algo único de cada um. E este algo, que apenas cada um de nós sabe o que é, nunca poderá ser dividido. - A voz dele soava, embora todo o corpo parecesse ser o de um cadáver. Até lentamente ele levantar sua coluna, deixando a cabeça pender para trás. - Entretanto... Aqui entramos em algo contraditório. Pois “nunca”, é nada mais que uma palavra. E como disse à vocês... – apontou novamente - ... As palavras não são nada perante o real ser de cada uma delas. Então. O que fazer?

E como se ganhasse forças aos poucos, o pierrot se levantou lentamente. Se mantendo de pé. Seu sorriso refletiu a luz de seu mundo limitado.  

- Milhares já tentaram. Não é mesmo? - E abriu os braços, recuperando a classe e se mantendo ereto. - Entender o homem. Entender o amor. Entender a vida. Entender a solidão. Entender a vida. Entender o destino. - E suspirou.

- ...É tempo perdido. - E o sorriso se fechou um pouco se tornando nada mais que um risco na face branca do Pierrot. - Não é preciso entender nada. Ou chegarão para um trágico fim. Não é preciso saber de nada. Pois realmente, nada se liga e nada se entrelaça. Não é preciso... Não é preciso... - E o risco morreu na formação de uma expressão entristecida. - Porque, os que tentam. Podem sofrer. Sofrer tanto...


- ... Quanto eu. - E o Pierrot direcionou seu olhar uma última vez para todos na escuridão. Logo em seguida, abriu um sorriso irônico e estalou os dedos. A luz se apagou ao seu comando. E naquela noite palmas não foram aclamadas. 

                                                            Imagem: The Stage, By Peacewisher222. Deviantart.

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